NINGUÉM ME ESCUTA

Falo com o gato
Falo com o pato
Falo com o rato
Falo com o sapo
Falo com o galo
Todos ficam calados
Não dizem nada
Continuam colados
São mudos
São surdos.

Falo com a vaca
Falo com a paca
Falo com a sapa
Falo com a foca
Falo com a macaca
Todas ficam caladas
Não dizem nada
Continuam coladas
São mudas
São surdas.

Falo com a goiabeira
Falo com a mangueira
Falo com a pitombeira
Falo com a ateira
Falo com a cajazeira
Não dizem nada
Ficam caladas
Tão paradas
São mudas
São surdas.

Falo com a Margarida
Falo com a Aparecida
Falo com a Cida
Falo com a Gessilda
Falo com a Cacilda
Não dizem nada
Ficam caladas
Tão descaradas
São mudas
São surdas.

Falo com o João
Falo com o Salomão
Falo com o Raimundão
Falo com o Carlão
Falo com o Lampião
Não dizem nada
Ficam calados
Tão desconfiados
São mudos
São surdos.

Tentei me comunicar com os seres vivos
Todos se recusaram a falar
Todos preferiram se calar
Até o pessoal que rege o monopólio da voz
Não quis expressar-se ao comer noz
- Acho que é desculpa.

Parece que os seres vivos estão com a língua grudada
Talvez aderiram à greve de voz
A qual iniciou-se na foz
Ontem de manhã.

- Queria conversar com alguém
Pois estou debaixo desse alpendre
Esperando que alguma alma se lembre
De mim.

Vou conversar com a estaca
Com a maca
Com a faca
Com a saca
Com a chácara
Com a xícara
Com a máscara
Já que os seres falantes se prendem
- Vão... Se defendam...